Urban Interaction Design e as Smart Cities

É cada vez mais comum ouvirmos o termo cidades inteligentes, e o que até pouco tempo podia ser visto apenas como um conceito que emergiria em um futuro distante, tornou-se uma realidade com casos de sucesso sendo aplicados em vários lugares ao redor do mundo. Em poucas palavras, vários aspectos da cidade estarão conectados à internet, e os administradores terão acesso a uma infinidade de dados, o que possibilitará melhores serviços para os habitantes.

Segundo artigo da FGV Projetos (unidade de assessoria técnica da Fundação Getúlio Vargas), “apesar de ser um conceito relativamente recente, o conceito de Smart City já se consolidou como assunto fundamental na discussão global sobre o desenvolvimento sustentável e movimenta um mercado global de soluções tecnológicas, que é estimado a chegar em US$ 408 bilhões até 2020. Atualmente, cidades de países emergentes estão investindo bilhões de dólares em produtos e serviços inteligentes para sustentar o crescimento econômico e as demandas materiais da nova classe média. Ao mesmo tempo, países desenvolvidos precisam aprimorar a infraestrutura urbana existente para permanecer competitivos. Na busca por soluções para esse desafio, mais da metade das cidades europeias acima de 100.000 habitantes já possuem ou estão implementando iniciativas para se tornarem de fato Smart Cities.”


 
Video da Vinci Energies sobre Smart Cities

Em 2014, alguns profissionais de diferentes áreas se reuniram na Alemanha com o objetivo de discutir e pensar sobre o conceito de Urban Interaction Design. O resultado desse projeto foi o livro Urban Interaction Design Towards City making, disponível aqui. A publicação é resultado de dois projetos: o UrbanIxD Project, com o subtítulo “Designing Human Interactions in the Networked City” e o “Book Sprints for ICT Research”. Entre os autores deste livro estão Juan Carlos Carvajal Bermúdez, Manu Fernández, Henrik Korsgaard, Ingrid Mulder, Katarzyna Piskorek, Lea Rekow and Martijn de Waal.

Urban Interaction Design Towards City making

Os autores começam o trabalho buscando uma definição para essa nova área: “O que é Urban Interaction Design? Obviamente, tem algo a ver com os três termos separados que dão nome para esse campo emergente. É sobre a interação de pessoas com seus arredores urbanos. Mas essa não tem sido sempre a preocupação principal de planejadores urbanos? Claro. No entanto, o que temos observado é que o ‘making of the city` (construir, fazer uma cidade) não é mais uma preocupação apenas dessas pessoas. E suas metodologias, áreas de conhecimento e teorias não são mais suficientes para resolver os complexos problemas das cidades interconectadas do século XXI. Por isso vemos cada vez mais designers de diferentes áreas, especialistas em TI, antropólogos urbanos, filósofos, pesquisadores de IHC, artistas e sociólogos se unindo em uma coalizão que até poucos anos atrás era impensável ”.

“Vemos cada vez mais designers de diferentes áreas, especialistas em TI, antropólogos urbanos, filósofos, pesquisadores de IHC, artistas e sociólogos se unindo em uma coalizão que até poucos anos atrás era impensável”. Urban Interaction Design Towards City making

Os autores então descrevem o que são essas “cidades híbridas” do século XXI: “Chame de cidade híbrida, cidade sensitiva, cidade mídia, ou o que você quiser: o que mudou na última década é a rápida tecnologização do dia a dia da vida urbana. É através das interfaces de nossos telefones móveis que entendemos o que está em torno, ao mesmo tempo conectando o local com o global. Da mesma forma, cidades e governos?—?muitas vezes com a ajuda de empresas?—?começaram a coletar todos os tipos de dados sobre a vida urbana, da qualidade do ar aos congestionamentos no trânsito. Querendo ou não, essa tecnologia penetrante tornou-se parte da nossa experiência no dia a dia. Software está organizando a vida urbana tanto quanto os planejamentos feitos pelos urban designers.”

“Querendo ou não, essa tecnologia penetrante tornou-se parte da nossa experiência no dia a dia. Software está organizando a vida urbana tanto quanto os planejamentos feitos pelos urban designers.” Urban Interaction Design Towards City making


imagem: http://smartcity.eletsonline.com/

Estudos sobre as emoções das pessoas?—?algo já estabelecido em UX, geralmente relacionado ao uso de um aplicativo ou software?—?vem ganhando proporções maiores, agora contextualizado com o conceito de se pensar a cidade de uma forma diferente.

Richard Coyne, da Universidade de Edimburgo, conduziu um experimento pioneiro. Coyne questiona: “Como o espaço em que você está afeta a forma como você se sente? Concluímos um estudo usando eletroencefalografia (EEG)?—?estudo do registro gráfico das correntes elétricas desenvolvidas no encéfalo?—?em pessoas andando em espaços abertos de Edimburgo. Achamos que isso é pioneiro. Este tipo de estudo geralmente acontece em um laboratório, com pessoas sentadas em frente a um monitor de computador e olhando para imagens de ruas ou paisagens de uma cidade. Em nosso estudo nós levamos a tecnologia EEG para as ruas.”

“Como o espaço em que você está afeta a forma como você se sente?” Richard Coyne

Richard prossegue dando mais detalhes: “A pesquisa foi empreendida por Panos Mavros, Jenny Roe, Peter Aspinall, e eu, Richard Coyne. Como pesquisadores em arquitetura, psicologia ambiental, estudos de saúde e design urbano, nós nos interessamos pela relação entre o ambiente e as emoções. Conduzimos um estudo usando EEG móvel como o método para gravar e analisar a experiência emocional de pessoas andando por três tipos de ambientes urbanos, incluindo um parque. Usando Emotiv EPOC, um gravador EEG portátil de baixo custo, os participantes andaram por 25 minutos por três diferentes áreas de Edimburgo. As áreas eram uma rua de lojas, um caminho ao longo de um espaço verde e uma movimentada área comercial. Nossas análises dos dados mostram evidências de baixa frustração, conflito e excitação, e um maior índice de tranquilidade quando as pessoas andavam pela área verde, e um maior conflito quando saiam dessa área. Nosso estudo fornece evidência em apoio a outros estudos de percepção e preferência baseados em questionários, observações e outras formas de dados sensoriais.”

Através deste estudo já foi possível chegar a conclusões interessantes: “Encontramos diferenças sistemáticas em gravações EEG entre as três áreas alinhadas com teorias sobre como alguns comportamentos, ambientes e tecnologias podem ajudar na recuperação de períodos curtos ou longos de stress ou doenças. Nosso estudo tem conclusões que visam promover áreas verdes em espaços urbanos para melhorar o humor, além de encorajar pessoas a andarem mais ou se engajarem em outras formas de atividades físicas ou reflexivas. Mais praças verdes, parques, árvores, acesso às áreas verdes ao redor das cidades, e um design urbano e arquitetura que incorporem mais dessa atmosfera dos espaços a céu aberto são sempre benéficos para nossa saúde e bem estar.”

Coyne conclui: “Nosso estudo também dialoga com a atual fascinação com técnicas de mapeamento GPS (global positioning systems) provendo novas avenidas para experimentos. As gravações do EEG portátil foram sincronizadas com dados de localização, e depois transformadas em mapas mostrando os diferentes níveis de leitura em diferentes pontos ao longo das jornadas.”


Playable City

Um evento importante sobre o tema é o Playable City Awards. O ArchDaily falou sobre o evento: “Desde 2013, a Watershed premia os melhores projetos no Playable City Awards, que acontece anualmente. No ano de estreia, o vencedor foi o projeto “Hello Lamp Post”, que estimula pedestres a conversar com objetos, como postes de luz e caixas de correio, usando seus smartphones. Em 2014, o vencedor foi “Shadowing”, que permite aos postes de luz da cidade gravar o movimento das sombras daqueles que passam. No ano passado, quem venceu foi o projeto “Urbanimals”, que incentiva pessoas a interagir com animais digitais, projetados nas paredes e no chão da cidade.” O áudio das palestras do evento ocorrido esse ano pode ser ouvido aqui.


Daniel Newman, CEO da Broadsuite Media Group, refletiu sobre a relação entre as cidades inteligentes e Big Data: “Embora haja muito buzz em torno de Big Data, acredito que em vários aspectos ainda é um conceito relativamente novo e inexplorado. No entanto, seu potencial para análise humana já é óbvio. Isso faz com que seja uma parte perfeita e integral no planejamento e criação de cidades inteligentes. Com o crescimento das populações e os recursos ficando mais escassos, o uso eficiente destes recursos limitados torna-se cada vez mais importante. Cidades inteligentes são um fator chave no consumo de materiais e recursos. Construídas e integradas com Big data, as cidades do futuro estão tornando-se uma realidade hoje. Controle de multidões é uma área na qual Big Data já está sendo usada com grande sucesso. Sempre que um grupo de pessoas muito maior do que o habitual se aglomera em um espaço, há uma necessidade não planejada para serviços naquela área. Isso inclui satisfazer as necessidades da multidão (comida, bebida, etc) e assegurar sua segurança (respondedores de emergência, polícia, etc). Com a população mundial crescendo e as cidades ficando cada vez mais cheias, esses eventos se tornam mais frequentes?—?e as cidades estão tentando desesperadamente prevê-los e entendê-los.”

Daniel fala sobre a relação da tecnologia com as cidades e traz alguns exemplos de aplicações que já vêm acontecendo: “Com o crescimento da nossa população e o advento de ideias como Big Data e a Internet da Coisas, o passo natural que as cidades irão tomar é tornarem-se mais interconectadas. Já há milhões de sensores instalados, monitorando várias coisas nas metrópoles. Num futuro próximo, esses sensores irão se multiplicar até que possam monitorar tudo, desde sinais de trânsito, passando por latas de lixo, até condições de estradas e consumo de energia.”

“Essas cidades inteligentes nos permitirão fazer um uso mais eficiente de nossos recursos, diminuir nosso consumo de energia, e construir nossas cidades para maximizar eficiência. Big Data é essencial para entender como as pessoas se locomovem pela cidade, como a energia é usada, como os vários aspectos da infraestrutura interagem, e muito mais. Cidades inteligentes também não são apenas um sonho distante do futuro. Algumas áreas urbanas já estão usando Big Data para melhorias:

“Essas cidades inteligentes nos permitirão fazer um uso mais eficiente de nossos recursos, diminuir nosso consumo de energia, e construir nossas cidades para maximizar eficiência. Big Data é essencial para entender como as pessoas se locomovem pela cidade, como a energia é usada, como os vários aspectos da infraestrutura interagem, e muito mais.” Daniel Newman

– Luzes de LED em Los Angeles: LA está substituindo 4500 milhas de luzes de rua com novos LEDs. Isso não resultará apenas em ruas mais claras, mas as novas luzes também serão um sistema interconectado que informarão sobre o status de cada uma das lâmpadas. Se uma não estiver funcionando corretamente poderá ser identificada e substituída quase imediatamente. No futuro poderemos ter luzes que mudam de cor e piscam para avisar os cidadãos sobre variadas condições.

– Paisagismo de Los Angeles: Para economizer água, LA está usando informação recolhida e analisada para substituir áreas com plantas não-nativas por uma flora nativa e resistente à seca.

– Novo Museu de História Natural de Xangai: O Museu de História Natural de Xangai recentemente construído tem uma forma espiral única. Essa forma foi particularmente inspirada pela concha de um nautilus (molusco marítimo), mas também incorpora análise de Big Data pra controlar o movimento da multidão.

– Arábia Saudita?—?cidade construída para controle de multidões: Todos os anos a população da Arábia Saudita cresce em mais de três milhões de pessoas que vão visitar Meca pelos cinco dias do Hajj. Tragédias ocorreram quando as multidões se descontrolam em desordem, mas a Arábia Saudita está lutando contra isso incorporando inúmeras ideias através do uso de Big Data para controlar essas multidões.”

“Como essas cidades demonstraram, a integração de Big Data e tecnologia interconectada?—?juntamente com o crescimento da população?—?levam à necessidade da criação de cidades inteligentes. Para continuar oferecendo segurança, conforto e lugares acessíveis para as pessoas viverem, as cidades devem incorporar técnicas e tecnologias que as levem para o futuro. Eu estou ansioso para ver os avanços que chegarão à minha cidade num futuro próximo.”

“Para continuar oferecendo segurança, conforto e lugares acessíveis para as pessoas viverem, as cidades devem incorporar técnicas e tecnologias que as levem para o futuro.” Daniel Newman


Como esses exemplos demonstram, as cidades inteligentes são uma consequência da integração de Big Data, Internet das coisas e tecnologia interconectada. As populações das cidades crescem cada vez mais, e melhorias em relação à segurança, conforto e uma maior preocupação com o meio ambiente são apenas alguns exemplos de como a tecnologia pode intervir de forma eficiente aumentando a qualidade de vida e deixando um legado que será continuado pelas gerações futuras.


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