UX para Minas Pretas

O problema brasileiro com a diversidade é um caso curioso e cruel. Curioso porque, a princípio, isso não é um problema. Um ambiente que abriga diversas etnias e culturas é por si só um fértil terreno para o fluxo de ideias diferentes, geradas a partir de vários pontos de vista que estimula a criatividade e a busca por soluções inovadoras e colaborativas. A riqueza dessa troca de experiências favorece a formação de um sistema de desenvolvimento inclusivo, com ganhos sustentáveis aos desenvolvedores em um modelo trabalhista e econômico verdadeiramente democrático.

Mas não é bem assim que a banda toca.

O preconceito brasileiro vem de nossa formação como nação, arraigada a um passado escravagista que há séculos vive entre nós. A desqualificação de qualquer pessoa pela sua raça é o nosso cruel cotidiano. Do apertar a bolsa contra o corpo quando se vê um negro se aproximando ao dar preferência à contratação de um branco só por uma questão racial são procedimentos muito comuns entre nós e em, muitos casos, aceito passivamente. Talvez esse seja o aspecto mais cruel de nossa discriminação: existir em atitudes veladas e não assumidas, escondidas em meio a piadas e brincadeiras que trazem a condição racial como um determinante de caráter. Quantas vezes não ouvimos algo como “ele é negro, MAS uma ótima pessoa” e  passamos batido como se fosse uma simples frase banal?

E se para um negro o cenário é absolutamente desfavorável, imagine para uma mulher negra?

UX para Minas Pretas, realizado na última segunda-feira, 01 de abril, na sede do Nubank em São Paulo, com apoio da DUXcoworkers e organizado por Robson Santos e Karen Santos, discutiu essas anomalias sociais  e como superar os obstáculos nesse sistema equivocadamente adverso.

Nesse sentido, vale ressaltar que o Nubank abriu vagas de trabalho em seu departamento de UX que você tem acesso por este link e este outro.

 

Desça da arquibancada

É comum ouvirmos as pessoas dizerem que são simpáticas a esta ou aquela causa. Pense em você: quantas vezes se posicionou desta forma? Agora faça uma rápida reflexão: qual foi seu nível de engajamento às questões que simpatiza?

A simpatia é um sentimento quase “fofo” que nos coloca como espectadoras que desejam um desfecho satisfatório a um acontecimento. Porém, como simples torcedoras, assistimos da arquibancada ao desenrolar dos fatos sem que nos aproximemos da problemática a ponto de nos envolvermos verdadeiramente com a questão.

Em sua palestra no UX para Minas Pretas, Diana Fournier, UX Researcher do Grupo Zap, salientou a necessidade urgente de sermos empáticas. A empatia traz o envolvimento por definição. É descer da arquibancada para o jogo, aprofundando-se no problema em busca de sua solução.  Ser empática é ser participativa. É conhecer as dores, as angústias, as aflições, sentindo na própria carne os retrocessos vividos por quem é alvo dessas disfunções sociais.

E sentindo a emoção de suas vitórias como se fossem suas – que de fato serão.

 

Pessoas não são números

No campo profissional, essa postura é desejada pelo mercado. Conhecer as angústias dos clientes, dividindo com eles suas dúvidas e aflições é uma oportunidade de se chegar a soluções mais amplas e completas. Ser solidária a sua dor mercadológica é um caminho árduo que exige responsabilidade e dedicação, mas oferece boas chances de sucesso. Nada pode ser mais enriquecedor do que se aprofundar nos problemas dos quais buscamos soluções.

Diana contou a um auditório lotado e atento que era uma pesquisadora que não enxergava a amplitude prática de seu trabalho por não relacionar suas descobertas com sua efetiva utilização. Passado um tempo, ela começou a trabalhar com o desenvolvimento de aplicativos e deixou a pesquisa de lado. Embora gostasse do que estava fazendo, algo lhe faltava. Foi somente no Grupo Zap que ela entendeu a importância do uso inteligente dos dados coletados numa pesquisa para o desenvolvimento do design de interação. A importância da pesquisa já é reconhecida no mercado, que vem abrindo cada vez mais espaço para profissionais do ramo. Nesse contexto, Diana ressaltou a necessidade de se estudar a área dando enfoque à descoberta das pessoas antes dos consumidores. Essa postura é fundamental para o desenvolvimento de projetos sólidos, que agreguem valores tangíveis aos consumidores, proporcionando-lhes uma experiência única e transformadora.

Independente da metodologia utilizada, a pesquisadora deve conhecer o ser humano.

Fernanda Passos também se preocupou com esse viés do campo de pesquisa em sua palestra, levando-nos a entender o quanto conhecer o usuário pode gerar mudanças significativas nas pessoas.

 

A arquitetura da informação

Fernanda compartilhou  sua experiência na Catho, onde trabalhou no desenvolvimento do aplicativo da empresa que funciona como uma ponte entre profissionais e empresas. Nesse projeto, ela entendeu a importância de se aprofundar na pesquisa comportamental para construir um serviço eficiente e satisfatório.

Só é possível criarmos soluções que façam a diferença na vida das pessoas se conhecermos como pessoas.

Quando o aplicativo da Catho foi criado, seu site já existia há algum tempo. Mas os processos de desenvolvimento de ambos foram bem diferentes. No app, houve uma maior participação de pesquisadores e designers que desenvolveram uma arquitetura da informação voltada para o máximo de eficiência do serviço.

Quando alguém procura o Catho, geralmente busca uma recolocação no mercado de trabalho e vive um momento que não é dos mais tranquilos. O desenho do aplicativo considera essa situação e traz outras variáveis que refletem as aspirações do usuário a partir da compreensão de sua situação no momento do acesso.  O uso dessas métricas resultou num substancial acréscimo de contratações das empresas via aplicativo quando comparadas as feitas pelo site. No aplicativo, contrata-se mais e melhor.

Samille Sousa, em sintonia com Fernanda, mostrou sua preocupação com a avaliação das pesquisas em relação às pessoas. Nós, como indivíduos, somos alvo de inúmeras pesquisas com objetivos diversos. Porém, não podemos segmentar as pessoas com base nesses resultados pois cada uma de nós é um ser único, dotado de características próprias.

E de vida.

 

A confiança muda tudo

Embora todas as palestras tenham tido inúmeros pontos em comum, o consenso geral ficou por conta da dificuldade das mulheres negras no mercado de trabalho. O ambiente naturalmente hostil às mulheres ganha contornos mais profundos e ofensivos às negras. Samille usou sua história de vida para traçar um amplo panorama desse cenário, relatando como o preconceito em cada um dos diversos lugares em que viveu se apresenta de uma forma particular. Sutis ou escancarados, a carga ofensiva e desrespeitosa presente em cada atitude segregacionista a afastava do convívio coletivo, relegando-a a pequenos grupos que, quando existiam, viviam suas mesmas dores.

O preconceito dói, machuca, afasta e desmotiva. Mas traz resiliência e força.

Com o passar do tempo, ela entendeu que sua luta por se estabelecer como uma profissional capaz de enfrentar os desafios da carreira e ganhar o reconhecimento por sua capacidade só seria possível se ela tivesse confiança em si mesma.

Investir no conhecimento, manter a autoestima e ter confiança em sua capacidade são aspectos decisivos para o sucesso.

Hoje, como UX Researcher, Samille acredita que as mulheres negras devem estar preparadas para superar os obstáculos no trabalho que não se restringem aos aspectos profissionais. Não se curvar ao preconceito, tendo orgulho de sua origem e acreditando em si próprias é uma maneira de enfrentar os percalços do caminho.

 

UXcoffee para minas pretas

Depois das palestras, público, palestrantes e organizadores se encontraram no UXcoffee. Pudemos perceber claramente o envolvimento da plateia com os temas abordados e o quanto esse tipo de evento é importante para unir e fortalecer.

Há um imenso potencial criativo que está à margem do mercado ou é mal aproveitado nas empresas.

Estimuladas a expressarem o que sentiram com tudo o que viram e ouviram no evento, as minas pretas esbanjaram carisma e belíssimos sorrisos, criando naturalmente um clima de interação e troca de ideias contagiante.

A DUXcoworkers está muito feliz com o que foi o UX para Minas Pretas. Sempre acreditamos no poder criativo e inovador da diversidade e procuramos oferecer um ambiente de trabalho motivador que favorece exclusivamente a competência. Por isso, hoje 90% da mão de obra da DUX é composta por mulheres.

E no UX para Minas Pretas, nossa felicidade por sermos o que somos aumentava a cada experiência que ouviamos, a cada conversa que participavamos. A inclusão social via integração e respeito a todas as pessoas, independente de etnia, gênero ou orientação sexual, é uma solução que extrapola o âmbito mercadológico.

É passada a hora de sermos agentes ativos dessa transformação, abrindo espaço para quem realmente quer fazer a diferença. Só nos livrando do preconceito nos tornaremos capazes de desenvolver um mercado amplamente competitivo e uma nação que cresce por inteiro e de forma consistente.

O tempo da simpatia passou. É hora de sermos empáticas.

 

Inspire-se com mais fotos das minas pretas em nosso Instagram.

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